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Profile Bernardo Belchior

Arrendar ou comprar casa para um jovem? Uma análise empírica

Arrendar ou comprar casa? Neste artigo faço uma análise com valores reais sobre qual das alternativas é mais rentável.

Olá!

Há uns tempos que ando a pensar neste assunto: comprar ou arrendar casa? Especialmente numa altura em que sou relativamente novo, gostaria de perceber se financeiramente — e não só — compensa mais comprar uma casa ou arrendar.

Este não vai ser um artigo normal de comparação entre compra e venda de casa, até porque será mais ajustado à minha situação — e provavelmente útil para muito mais gente em situações semelhantes.

Há muitas pessoas que afirmam que arrendar é basicamente “deitar dinheiro ao lixo” e que é apenas uma situação temporária até comprar uma casa permanente. No entanto, dependendo do cenário, arrendar pode ser monetariamente melhor que comprar. Vamos fazer uma análise.

Arrendar

A maior parte dos benefícios de arrendar são óbvios. Temos o facto de ser necessário menos capital para obter uma habitação, uma vez que para arrendar geralmente basta pagar o primeiro mês de renda e oferecer como fiança um ou dois meses.

Existe também a vantagem da flexibilidade: se quiseres viver num apartamento apenas seis meses, os custos e a burocracia de compra e venda são proibitivos.

Além disso, há também a benesse de não necessitar de fazer manutenção da casa.

Por outro lado, cada renda paga é dinheiro desperdiçado, isto é, não tem um retorno financeiro positivo. No entanto, pode ser encarado como a compra de um serviço: o senhorio oferece um sítio para viver em troca de dinheiro, e não há a necessidade de se preocupar com a maior parte dos problemas.

Comprar

As desvantagens comprar uma casa são óbvias: existe o imenso capital necessário para fazer a compra, ou o capital relativamente elevado para dar entrada num crédito habitação. Além disso, há a possibilidade de haver problemas na casa e ser necessário fazer obras, manutenção ou reparos.

Ademais, existem os impostos sobre o valor do imóvel, seguros necessário para contratar um crédito, o valor da escritura, etc.

Finalmente, ao comprar uma casa, perde-se a flexibilidade de arrendatário, obrigando a vender ou arrendar a casa no evento de querer mudar de habitação — ou pior, deixar a casa livre sem render nada.

Como contraste, temos o benefício de estarmos a pagar por algo que se tornará nosso e que oferece a tranquilidade de ter um teto por cima da cabeça.

Peculiaridades de um Jovem

Especialmente para jovens, não se espera que tenham um grande capital inicial. Como é suposto decidir neste caso?

Bem, o início é facil: enquanto não temos o valor de entrada para uma habitação, vamos ter de arrendar. No entanto, quando conseguirmos poupar o suficiente para contrair um crédito habitação, o que devemos fazer?

Neste caso, vou estudar 2 opções. Todas elas têm em comum o pressuposto de que cerca dos 30 será necessária uma casa maior para quem queira constituir família:

  1. Arrendar por 6 anos e depois comprar um T2
  2. Comprar um T1 para viver sozinho e vender ao final de 6 anos

Comprar ou Arrendar?

É sempre complicado arranjar valores que sejam válidos para toda a gente. Por isso, irei utilizar valores de um portal imobiliário tendo em conta os apartamentos no concelho do Porto. Provavelmente os valores diferirão para quem viver em Lisboa, mas o método pode facilmente ser extrapolado para outras cidades ou países.

Arrendar por 6 anos

Atualmente, parece-me possível arrendar um T1 no Porto por cerca de 550€ por mês.

Este é o cenário mais simples: para obter o dinheiro gasto basta multiplicar a renda pela duração em meses. Neste caso, dá um total de 39 600€.

Comprar um T1 e vender ao final de 6 anos

Segundo os preços atuais, é possível arranjar um T1 de aproxidamente 60 metros quadrados por cerca de 160 000€. Assumamos que vamos pedir um crédito habitação correspondente a 90% do valor do imóvel, o que significa uma entrada de 16 000€ e uma dívida de 144 000€, mais juros.

De acordo com este artigo, podemos estimar os impostos de compra para esta habitação segundo os seguintes cálculos:

  • Imposto de selo sobre a transação do imóvel: 0.8% * 160 000€ = 1280€
  • Imposto de selo sobre o crédito habitação: 0.6% * 144 000€ = 864€
  • Registo da escritura (assumindo o valor do artigo): 650€
  • IMT: 5% * 160 000€ - 5640,23€ = 2359,77€

Resumindo, os impostos de compra totalizam 5153,77€.

Utilizando o método francês de amortização, obtemos a simulação de um crédito habitação a 40 anos para uma casa de habitação primária de 160 000€. Oferecendo uma entrada de 16 000€ (10%) e taxa de juro fixa a 2%, o simulador mostra-nos numa prestação mensal de 436,07€.

Posto isto, ao longo dos seis anos pagaríamos um total de 31 396,96€ em prestações, mais 5153,77€ de impostos, que resultam num total de 36 550,73€.

De acordo com a Deco, um seguro de vida para uma pessoa de 24 anos custa cerca de 130,13€ por ano, ou 10,84€ mensais. Além disso, por lei, é obrigatório que a habitação tenha um seguro contra incêndios. Contudo, parece-me que o mais comum é um seguro multirriscos, que protege também contra inundações, roubos, etc. De acordo com a Deco, um seguro deste género custa aproximadamente 58,46€ por ano, ou seja, 4,88€ por mês.

Adicionalmente, é necessário pagar também o IMI anualmente. De acordo com este simulador, uma casa que valha 160 000€ no concelho do Porto paga um IMI anualmente de 480€.

Por fim, geralmente aceita-se a regra de 1% do valor da propriedade como gastos de manutenção anual, ou seja, um custo acrescido de 1600€ por ano ou 9600€ ao final dos 6 anos.

Estes custos obrigatórios — seguros, IMI e manutenção — ao final de 6 anos resultam numa soma de 13 611,54€, que, juntando a valor anterior, totaliza 50 162,27€.

Utilizando uma calculadora de juro francês obtemos que, dos 50 162,27€ pagos nos seis primeiros anos, 14 985,65€ são capital pago da casa, isto é 14 985,65€ mais a entrada (16 000€) são a parte nossa da casa (cerca de 19% do valor de compra), e os restantes 35 176,62€ são custos de seguros, pagamentos de juros, impostos e manutenção.

Até agora, apesar de pagar 15 000€ mais no caso de compra de casa e necessitar de uma entrada de 10%, que não é, de todo, insignificativa, no final ficamos com 19% da casa paga, ao invés de pagar 39 600€ a um desconhecido e ficar sem nada. É óbvio que é melhor comprar a casa, não?

Infelizmente, não é assim tão óbvio. Quanto valeria o dinheiro não gasto se tivéssemos investido noutro sítio? Isto é, se tivesse investido o dinheiro da entrada mais os impostos de compra na bolsa de valores, quanto valeria agora?

Custo de Oportunidade

O custo de oportunidade é o custo de não ter a possibilidade de agir quando aparece uma oportunidade. Por exemplo, neste caso vamos alocar a entrada de 16 000€ mais impostos à compra da casa e, portanto, não podemos investir noutros veículos possivelmente mais rentáveis, ou seja, estamos possivelmente a perder a rentabilidade que nos dariam esses 21 000€ investidos noutros ativos.

Este é um ponto que muita gente ignora e que leva à conclusão de que comprar vale sempre a pena, monetariamente falando. Na prática, não é verdade, porque há certos casos em que outros investimentos podem oferecer melhores resultados. Vamos avaliar este cenário.

Para calcular o custo de oportunidade é preciso perceber a diferença de retorno entre ambas as alternativas. De um lado, temos o investimento na compra de casa, do outro, temos todo um mundo de possibilidades, mas para este caso utilizarei o MSCI World Index para estabelecer a comparação, que tem uma rentabilidade de 5,82% anualizados desde 2000.

De acordo com o Instituto Nacional de Estatística, o valor mediano das vendas por metro quadrado de T0 ou T1 na Área Metropolitana do Porto cresceu de 905€ no terceiro trimestre de 2016 até 1488€ no terceiro trimestre de 2020. Isto resulta num crescimento anual de 13,2%.

Um crescimento de 13% anual é definitivamente incrível, contudo resultados passados não garantem retornos futuros. Especialmente numa habitação que, ao contrário de empresas, não são um ativo produtivo, espera-se que a rentabilidade se situe perto do valor da inflação. Além disso, o período providenciado pelo INE é de apenas 4 anos e muito provavelmente não representativo da evolução do preço das habitações no Porto.

Utilizando os 13,2% de crescimento do valor das propriedades no Porto, o custo de oportunidade é de -7,38%, isto é, a favor da compra de casa. No entanto, na minha opinião, este valor não é sustentável a longo prazo, portanto utilizarei um valor mais conservador de 3%, 1,2 pontos percentuais acima da inflação média dos últimos 20 anos.

Neste caso, obtemos um custo de oportunidade de 2,82%, que é calculado subtraindo a valorização anual da habitação à rentabilidade esperada do MSCI World Index.

Este custo de oportunidade é aplicado a favor do arrendamento, uma vez que não requer a entrada de 16 000€. Ao longo dos 6 anos, este valor crescerá 2,82% mais do que o valor da casa, ou seja, o custo de oportunidade da compra será de 21 153,77€ * (2,82%)^5 - 21 153,77€ = 3 155,72€ ao final do horizonte temporal. Por outras palavras, de dois investimentos de 21 153,77€: um numa casa (tendo apenas em conta a sua valorização), outro no MSCI World Index, é esperado que ao fim de 6 anos o segundo renda 3 155,72€ adicionais, quando comparado com o primeiro.

Conclusão

Para concluir qual das opções é preferível, financeiramente falando, temos de as comparar em pé de igualdade:

  • A opção de renda custa 39 600€ ao final de 6 anos e permite investir os 16 000€ de entrada mais impostos, que de acordo com o custo de oportunidade, valerão 21 153,77€ * (5,82%)^5 = 28 068,98€ ao final dos 6 anos.
  • A possibilidade de compra tem um custo de 50 162,27€. Além disso, tem também 14 985,65€ de equity ao final dos 6 anos e, assumindo que a casa valorizou 3% anualmente, os 16 000€ de entrada valem agora 16 000€ * (3%)^5 = 18 548,39€, para um total de 33 534,03€ em ativos.

Qual vale mais a pena?

Bem, primeiro temos de tornar os resultados mais comparáveis. No primeiro caso temos 28 068,98€ / 39 600€ = 0.71€ de ativo por cada euro de custo, enquanto no segundo temos 33 534,04€ / 50 162,27€ = 0.67€ de ativo por cada euro de custo. Utilizando estes valores, dá para perceber que, neste caso, cada euro é mais eficientemente gasto no caso de arrendar a casa.

Concluindo, a melhor opção neste cenário, financeiramente falando, é o arrendamento. Surpreendente, não?

Para mim também o é. Esperava que, ao finalizar a escrita deste artigo, a alternativa de compra de casa fosse a mais recompensadora. Teorizo que terá algo a ver com a psicologia do investidor que tem dificuldade em perceber que há muitos custos associados com a transação e posse imóveis, acabando por ser significantes no resultado final e tender a balança para o lado do arrendamento.


Espero que este artigo te tenha sido útil para perceber há vezes em que arrendar vale a pena, principalmente pelo custo de oportunidade de comprar uma casa. É estranho que seja possível uma pessoa arrendar a casa uma vida inteira e ainda ficar melhor financeiramente, mas pode acontecer. Tudo depende do mercado.

Obrigado e até à próxima!

Nota: é óbvio que foram feitas muitas assunções e suposições, portanto na prática os valores poderão ser muito diferentes. Além disso, as previsões de como se irá comportar o mercado de ações e imobiliário são sempre pouco fiáveis. Posto isto, o melhor que se pode fazer é ajustar os valores a cada caso, mas haverá sempre uma grande incerteza inerente à previsão do futuro.

Editado a 11 de fevereiro de 2021: correção dos valores da soma de seguros, manutenção e IMI de 16 491,54€ para 13 611,54€. O valor anterior tinha sido erradamente calculado devido ao IMI ao final dos 6 anos ter sido somado duas vezes.

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